Deísmo
Segundo Louis de Bonald, pensador francês que se opôs à revolução de 1789, deísta é quem não teve tempo de chegar a ser ateu; mais de um século depois, seu compatriota Paul Hazard afirmaria que é quem não quis chegar a ser ateu. As duas opiniões ilustram a controvérsia em torno do deísmo.
Deísmo é a denominação genérica dada às doutrinas filosóficas e religiosas, surgidas sobretudo no fim do século XVII, que afirmavam a existência de Deus como exigência da razão, independentemente de qualquer revelação, histórica e positiva, e a partir da identificação da razão com a natureza. O conceito coincide com o teísmo no fato de admitir a existência de um Ser Supremo, criador do mundo e diferente dele; mas difere do teísmo ao considerar que a responsabilidade desse deus em relação ao mundo é unicamente a de lhe haver dado leis: uma vez realizado o ato de criação, não se ocupa do mundo - abandonado a suas próprias leis físicas - nem pede nenhum culto por parte dos homens. Tais formulações, contudo, não são comuns a todos os pensadores que foram chamados deístas. Nem se pode dizer que estes elaboraram um corpo doutrinário específico.
Raízes do Deísmo
De uma perspectiva histórica, o deísmo é um fenômeno cultural típico dos séculos XVII e XVIII, que se enraíza no humanismo antropocentrista do Renascimento - o qual deslocou de Deus para o homem o interesse cultural -, no cientificismo então nascente, no racionalismo e no empirismo.
Os representantes dessa tendência compartilhavam tanto a confiança na capacidade da razão como a suspeita quanto a tudo o que pretendesse superá-la. De igual modo, acreditavam numa forma de religião natural, isto é, aceitavam a existência de um substrato religioso que podia ser captado racionalmente, mas negavam qualquer fator sobrenatural e consideravam que tudo o que se podia conhecer desse Ser Supremo era sua própria criação, a natureza, na qual o homem devia buscar suas normas de conduta.
Nem todos os pensadores deístas, contudo, coincidiam nas posturas filosóficas e religiosas, nem chegavam ao postulado extremo de que Deus carecesse totalmente de relações com o mundo. Em muitos aspectos, portanto, o deísmo era uma forma de justificação racional do sentimento religioso, que se opunha ao recurso à fé e à revelação.
Histórico. O termo "deísmo" foi cunhado na França no século XVIII, mas as teses deístas já haviam sido expostas na primeira metade do século anterior por Lord Herbert Cherbury, considerado o pai do deísmo britânico. A difusão do deísmo na Inglaterra se deveu em boa parte à oposição tanto à Igreja Anglicana como ao fanatismo puritano. Assim, o livre-pensador John Toland, autor do célebre tratado Christianity not Mysterious (1696; Cristianismo sem mistérios), afirmou que "a autêntica religião não é senão o exercício da moralidade considerada como obediência a Deus".
Voltaire divulgou na França as obras dos deístas ingleses. Contudo, a base empirista britânica foi substituída por um fundamento mais próprio do racionalismo francês: à defesa do "grande arquiteto" do universo acrescentou-se o anticlericalismo dos enciclopedistas. Assim, embora o próprio Voltaire acreditasse numa forma de providência divina, outros pensadores franceses - como Diderot, que considerava "teístas" os deístas ingleses - prontamente evoluíram para o ateísmo.
Na Alemanha, terceiro grande foco do Iluminismo europeu, o deísmo adquiriu matizes mais acadêmicos. H. S. Reimarus considerava que a religião revelada nada pode acrescentar à religião natural, caso contrário Deus estaria corrigindo sua própria obra. Kant, o mais importante filósofo alemão do século XVIII, acentuou os aspectos éticos da religião natural e afirmou que os princípios morais não são produtos da revelação, mas inatos à razão humana.
Em linhas gerais, portanto, o deísmo é menos uma doutrina estrita que uma tendência filosófica que realça, em maior ou menor grau, a liberdade humana dentro do conjunto da criação.
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"DEÍSMO. Estudante de Filosofia, 2024.
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