Estética


O significado da beleza e a natureza da arte têm sido objeto da reflexão de numerosos autores desde as origens do pensamento filosófico, mas somente a partir do século XVIII, com a obra de Kant, a estética começou a configurar-se como disciplina filosófica independente.

Ciência da criação artística, do belo, ou filosofia da arte, a estética tem como temas principais a gênese da criação artística e da obra poética, a análise da linguagem artística, a conceituação dos valores estéticos, as relações entre forma e conteúdo, a função da arte na vida humana e a influência da técnica na expressão artística. Os primeiros teóricos da estética foram os gregos, mas como "ciência do belo" a palavra aparece pela primeira vez no título da obra do filósofo alemão Alexander Gottlieb Baumgarten, Æesthetica (1750-1758). A partir dessa obra, o conceito de estética restringiu-se progressivamente até chegar a referir-se à reflexão e à pesquisa sobre os problemas da criação e da percepção estética.

Antiguidade Clássica

A arte, objeto mais geral da estética, tem sido considerada de maneira distinta segundo as épocas e os filósofos que dela se ocuparam. Na antiguidade, o problema do belo foi tratado por Platão, Aristóteles e Plotino. No diálogo Hípias maior, Platão procura definir o belo em si, a idéia geral ou universal da beleza. No Banquete e no Fedro, o problema da beleza é proposto em função do problema do amor. Por meio de imagens sensíveis, da cópia ou imitação da Idéia, e no delírio erótico, somos possuídos pelo deus, o que leva à reminiscência e à visão da realidade absoluta da beleza inteligível.

Na República, Platão sacrifica a estética à ética: critica os poetas que atribuem aos deuses fraquezas e paixões próprias dos mortais e acrescenta a essa crítica outra de ordem metafísica: a arte não passa de imitação da aparência, ou seja, é cópia de um objeto sensível, que, por sua vez, já é cópia, e imperfeita, da Idéia. Assim, a arte produz apenas a ilusão da realidade.

Nas reflexões de Aristóteles sobre a arte (imitação da natureza e da vida, mimesis), dominam as idéias de limite, ordem e simetria. Sua Poética aplica esses princípios à poesia, à comédia, à epopéia e afirma que "o Belo tem por condição certa a grandeza e a ordem". Plotino, seguindo a inspiração platônica, indaga nas Enéadas se a beleza dos seres consiste na simetria e na medida, pois tais critérios convêm apenas à beleza física, plástica, indevidamente confundida com a beleza intelectual e moral. O próprio ser físico, sensível, só é belo na medida que é formado por uma idéia que ordena e combina as múltiplas partes de que o ser é feito.

Escolástica

A filosofia medieval inspirou-se no idealismo de Platão e no realismo de Aristóteles. Para os escolásticos, a arte é uma virtude do intelecto prático, um hábito de ordem intelectual que consiste em imprimir uma idéia a determinada matéria. Santo Tomás de Aquino definia a beleza como "aquilo cuja visão agrada", cujos requisitos são a proporção ou harmonia, a integridade ou unidade e a clareza ou luminosidade.

Kant

Na Crítica do juízo (ou da faculdade de julgar), que examina os juízos estéticos, ao referir-se aos objetos belos da natureza e da arte, Kant concebe o juízo estético como resultado do livre jogo do intelecto e da imaginação e não como produto do intelecto, ou seja, da capacidade humana de formar conceitos, nem como produto de intuição sensível. O juízo estético provém do prazer que se alcança no objeto como tal. Exprime uma satisfação diferente daquela que é proporcionada pelo agradável, pelo bem e pelo útil.

O belo, diz Kant, "é o que agrada universalmente, sem relação com qualquer conceito". A satisfação só é estética, porém, quando gratuita e desligada de qualquer fim subjetivo (interesse) ou objetivo (conceito). O belo existe enquanto fim em si mesmo: agrada pela forma, mas não depende da atração sensível nem do conceito de utilidade ou de perfeição. No juízo estético verifica-se o acordo, a harmonia ou a síntese entre a sensibilidade e a inteligência, o particular e o geral.

O prazer estético é universalizável, porque as faculdades que implica estão presentes em todos os espíritos. Esse senso comum estético é a condição necessária da comunicabilidade universal do conhecimento, que deve ser presumida em toda lógica e em todo princípio de conhecimento.

Quanto às origens da arte, Kant diz que a imaginação é compelida a criar (causalidade livre) o que não encontra na natureza. A arte é, pois, a produção da beleza não pela necessidade natural, mas pela liberdade humana. Kant propõe uma classificação das "belas-artes" em artes da palavra (eloqüência e poesia), figurativas (escultura, arquitetura e pintura), e as que produzem um "belo jogo de sensações", como a música. Todas se encontram na arte dramática e, de modo especial, na ópera.

Hegel

O objeto da estética, segundo Hegel, é o belo artístico, criado pelo homem. A raiz da arte está na necessidade que tem o homem de objetivar seu espírito, transformando o mundo e se transformando. Não se trata de imitar a natureza, mas de transformá-la, a fim de que, pela arte, possa o homem exprimir a consciência que tem de si mesmo. O valor ou o significado da arte é proporcional ao grau de adequação entre a idéia e a forma, proporção que permite a divisão e classificação das artes. Sua evolução consiste na sucessão das formas nas quais o homem exprime suas idéias a respeito de Deus, do mundo e de si próprio.

As diferentes formas de arte correspondem às diferentes maneiras de apreender e conceber a idéia e às diversas modalidades de incorporação do conceito à realidade. A propósito, Hegel distingue três dessas modalidades, a que correspondem, metafísica e historicamente, as três formas fundamentais da arte: arte simbólica, arte clássica e arte romântica. Para Hegel, a história da arte, do ponto de vista da filosofia, mostra que a arte simbólica está à procura do ideal, a arte clássica o atinge e a romântica o ultrapassa.

A evolução da arte reproduz a dialética da idéia infinita, que se nega ou aliena no finito, para negar a negação na síntese do finito e do infinito. A esse processo correspondem graus crescentes de interiorização do espírito, desde a arquitetura, arte do espaço vazio, mero receptáculo do divino, até a poesia, arte puramente interior ou subjetiva.

Benedetto Croce

Os princípios estéticos de Hegel, desprezados na Alemanha durante toda a segunda metade do século XIX, foram preservados na Itália por Francesco De Sanctis. Seu sucessor é Croce, cuja estética, baseada no conceito da expressão individual, exerceu profunda influência no mundo inteiro. Segundo Croce, qualquer ato artístico é meio de expressão e esta é a origem do lirismo. Só enquanto lirismo as obras de arte são arte e têm valor estético. Uma das conseqüências dessa estética como ciência da expressão é a abolição das fronteiras entre todas as artes e entre todos os gêneros literários.

Marxismo

A estética marxista, apenas esboçada na obra de Marx e Engels, é tributária da estética hegeliana, em que encontra sua justificação, e parece ter achado sua formulação mais completa na obra do dramaturgo e encenador Bertolt Brecht. A tese do "distanciamento" (Entfremdung), de Brecht, implica uma ruptura com a concepção clássica da arte como catarse. O espectador toma consciência dos problemas que lhe são apresentados na cena e é convocado a decidir e optar, colaborando na tarefa de libertação do homem: seria esta a razão de ser da obra de arte.

Os filósofos do Instituto de Pesquisas Sociais, mais conhecido como Escola de Frankfurt, constituíram o núcleo de uma linha original de pensamento estético de inspiração marxista, desenvolvido principalmente por Walter Benjamin e Theodor Adorno. Benjamin analisou o papel da obra de arte na época da reprodução mecânica e Adorno formulou o conceito de "indústria cultural" para designar o tratamento de mercadoria aplicado aos bens culturais na sociedade contemporânea.

Existencialismo

A filosofia da existência não suscitou uma estética propriamente dita, embora alguns de seus representantes (Kierkegaard, Nietzsche, Heidegger, Sartre) tenham refletido sobre a arte e seus problemas. Para Heidegger, a arte em sua essência é uma origem: um modo eminente de acesso da verdade ao ser. Sartre, no meio da tradição hegeliana e marxista, oferece em seus ensaios sobre literatura os elementos do que poderia ser uma estética, especialmente literária. Para ele, a gratuidade da obra de arte é a imagem da liberdade. O artista, ao revelar o mundo e propor implicitamente sua mudança, desempenha a função de inventar-se a si mesmo, ao mesmo tempo em que inventa a história.

Estruturalismo

Ao examinar os problemas tradicionais da estética em função das repercussões, no domínio da arte, das novas formas de comunicação e informação representadas pelo rádio, cinema e televisão, o estruturalismo trouxe importantes contribuições à análise da obra de arte, vista como estrutura aberta e dotada de significados múltiplos. Contribuições de pensadores como Abraham Mole, Michel Foucault, Roland Barthes e Umberto Eco enfocam a revolução científica e tecnológica dos tempos modernos que, ao transformar o mundo e o homem, cria nova realidade, determina o surgimento de novas formas de arte, como o cinema, e de novas teorias ou interpretações da criação estética.

     
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